Acredite,
esse gordo manjava dos paranauês.
Veja como o nosso ambiente
de trabalho é divertido. Te pagaremos mal e não respeitaremos a sua hora de
almoço. Hora-extra? Nem pensar! Whatsapp depois do trabalho? Com certeza,
afinal de contas, você ainda não tem filhos! Ah, mas te daremos kit kat e café expresso
de graça!
O
que diabos aconteceu com a GERAÇÃO Y?!
Um texto sobre liberdade,
responsabilidades e as misérias de uma geração que está se perdendo no meio do
caminho.
Na semana passada eu ouvi de
um garoto, ainda na faculdade, o seguinte depoimento:
“Seu texto sobre a
subserviência das empresas em relação ao cliente deveria ser pregado na porta
de entrada de todas as empresas do país, nas salas de reuniões e ser repetido
como mantra em palestras de empreendedorismo para todos os empresários do Brasil.
As agências de publicidade, especificamente, estão atingindo um nível de
servidão pior do que pastelaria.
Na pastelaria ninguém fica
acelerando o pasteleiro. Ninguém manda e-mail para o pasteleiro mandando ele
entregar o pastel na mesa dele até as 9h da manhã. Para o pasteleiro, quanto
mais horas ele trabalhar, mais ele vai ganhar. Falar em hora extra em
publicidade só vai fazer as pessoas rirem. Enfim, desculpa o desabafo”.
Somos uma geração de bobos
que se acha esperta. Nossos pais davam duro, saiam de casa cedo, trabalhavam
como doidos, indo e vindo do centro da cidade, em cartórios, lotéricas e
visitas bancárias, muitas vezes em carros sem ar-condicionado, mas ganhavam bem
o suficiente para sustentarem uma família com três filhos, carro, cachorro e ainda
levavam todos para comerem churrasco aos domingos.
A geração de hoje se deixa
enganar pela falsa sensação de divertimento, que nunca tem fim. Transformaram o
ambiente de trabalho em um circo, para que você ouça: “Ei, mas aqui é
divertido! Dane-se se não te pagamos horas-extra ou se te colocamos para
trabalhar por toda a madrugada em troca de pizza. Aqui você pode trabalhar com
boné!”.
Quando nossos pais estavam
em casa, eles estavam em casa mesmo! Dane-se que o trabalho tinha sido duro,
após as 18:00 eles sentavam naquele sofá da Mesbla, abriam a primeira Antártica
da noite e era a hora do futebol. Qual foi a última vez que você esteve
realmente desconectado do seu trabalho? Você tenta se convencer de que aquele
Whatsapp do cliente às 00:00 não é nada demais, que é coisa pequena, que “pega
mal” não responder. E aquele inbox no Facebook às 1:35 da manhã? “Ah, eu já
estou aqui mesmo, né. Agora ele já viu que eu visualizei…”.
Provavelmente você caiu no
mito do home-office libertador, que te faz perceber, anos depois, que ele só
foi capaz de te “libertar” do horário comercial. “Ah, mas você trabalha em
casa!” — pronto, é sinal de que receberá demandas ou mensagens a qualquer hora
da madrugada.
Provavelmente você ainda não
se ligou, mas você produz dezenas de vezes a mais do que o seu pai ou os seus
tios conseguiam. Antes, para atender um cliente, você precisava ir na loja ou
na casa dele, lá na puta que o pariu. Hoje? Skype. Antes, era FAX ou mandar
documentos pelos correios. Hoje? E-mail. Antes, você estava limitado à sua
cidade. Hoje? Internet, meu filho!
Entretanto, quanto é que
você está ganhando? Acorde para a vida! Agências com mesa de sinuca, totó,
chocolates à vontade, cafezinho expresso, pula-pula e vídeo-games significam
apenas que você está pagando por tudo aquilo e que o seu salário, ao final do
mês, sentirá a pancada.
“Tudo
bem, porque eu amo o que eu faço!”.
Na semana retrasada eu ouvi
isso. Estava contratando os serviços de uma START-UP de tecnologia para um dos
meus negócios e havia esquecido de perguntar alguma coisa. Já eram 23:00 horas.
Fui ao Skype, me certifiquei de que a menina do suporte estava OFFLINE e deixei
uma mensagem. Poderia ter feito isso pelo Facebook, mas eu sabia que iria
apitar lá na casa dela e não queria esse tipo de coisa, ainda mais naquele
horário. Enfim, enviei a mensagem e deixei escrito: “Só me responda quando
chegar ao escritório!”.
Faltando quinze minutos para
uma da manhã, a menina me responde, pelo Facebook. Eu digo: “O que você está
fazendo aqui? Te deixei uma mensagem no Skype! Vá dormir, namorar ou assistir
aquelas séries no Netflix!” e ela me disse: “Ah, é que eu entrei no meu skype
só para ver se estava tudo bem com os clientes. Vi a sua mensagem e retornei.
Não custa nada, nem se preocupe. Eu amo o que faço. Rs”.
Eu amo o que faço…erre esse.
À uma da manhã de terça feira. Com o teu chefe te pagando, provavelmente, entre
dois mil e quinhentos a três mil reais para isso…e somos nós quem somos a
geração dos “desapegados, que querem viver a vida”.
Estamos nos tornando uma
geração de trintões cujas preocupações são os próximos shows do Artic Monkeys,
a cerveja gourmet da moda e a próxima temporada de House of Cards. Uma geração
sem filhos, que foge das responsabilidades, se iludindo com a ideia de que o
seu chefe é seu amigo e que por isso você “quebra alguns galhos para ele”.
Ouvimos de todo tipo de
especialista, que somos a geração livre por excelência, que preza pela
mobilidade e pela qualidade no ambiente de trabalho, mas de alguma forma nós
erramos o caminho e nos tornamos aquele tipo de gente que fica conversando com
o cliente às 20:00 horas, enquanto janta com a mulher. E nos achamos o máximo,
quando batemos o pé: “Ai, que saco, o meu chefe não me deixa em paz!”. Que
corajoso!
Olhávamos para nossos pais e
avós e pensávamos que eles eram escravos da própria família. Que haviam tido
muitos filhos e que isso, de alguma forma, os prendeu em uma vida cheia de
amarras e limitações, mas, hoje, advinha só? Da sua idade ele já tinha casa
própria e carro na garagem. E você? Figuras de ação do Mega-Man.
Em algum ponto entre o final
da faculdade e o começo da vida adulta, nós perdemos a mão. Não estamos
estabelecendo relações saudáveis de empregador e empregado, mas um misto de
coleguismo com parceria e com prováveis projetos que poderão mudar o mundo, mas
que não ajudam a pagar o aluguel.
Ah, mas você não é
empregado? Tem o seu próprio negócio? É um empreendedor em início de carreira?
As notícias também não são muito boas…
Você também é um escravo!
Com a popularização da
tecnologia e da conectividade, os super-heróis deixaram de ser os esportistas e
os homens engravatados de Wall-Street e passaram a ser os empreendedores do
vale do silício. Aquele tipo de pessoa que usa camiseta sempre da mesma cor,
tênis, vai trabalhar de bicicleta e mantém uma dieta ecologicamente adequada.
Aqui nós somos felizes e
podemos levar o nosso cachorrinho para o trabalho, às sextas-feiras. Para falar
a verdade, trabalhar aqui é tão legal, que nem precisamos voltar para casa!
Com isso, surgiu a cultura
da motivação constante e da satisfação do cliente a qualquer custo. Não importa
o que aconteça, a experiência do seu cliente deve sempre ser a melhor possível;
ainda que ele seja um babaca!
Eu posso te falar uma coisa?
Nem sempre o seu cliente tem razão. Nem sempre ele sabe o que é o melhor para o
negócio dele e nem sempre aquele “logo dourado com bordas vermelhas, estilo a
da propagada da mortadela Seara” é a melhor opção. O problema é que dizer isso
na cara dele agora se tornou um crime! Não é proativo e engajado discutir com o
cliente, ainda que ele esteja escandalosamente errado!
A cultura desses caras,
importada para cá de uma maneira incompatível com a nossa realidade, diz que
devemos buscar a composição sempre, fazermos reuniões intermináveis até que
todos estejam satisfeitos e sorridentes. Dar pesos e medidas iguais aos
especialistas e aos curiosos. O que acontece? Tentar extrair o dente do
paciente com uma colher de pau.
Estamos na décima sétima
alteração e o contrato diz que só faríamos até cinco? Sem problemas! A
satisfação do cliente em primeiro lugar! Ele acha que não precisa fazer um
contrato com você? Sem problemas, lá fora muita gente deixa isso para lá! O
que? Agora ele não está te pagando? Cuidado! Não o cobre de maneira que possa
parecer ofensiva! Não é isso que a Amazon faria!
Você está preso em uma
camisa de força verbal.
A camisa de força verbal é
um dos institutos comportamentais que mais causa dano à mente e à consciência
de qualquer pessoa. No empreendedorismo, 90% dos profissionais sofrem desse
tipo de mal.
A maior libertação, para qualquer
proprietário, é quando este alcança certo grau de autonomia, que pode chamar a
atenção do seu cliente e fazê-lo perceber que aquilo é para o seu próprio bem.
Que, identificando o erro, ele está é justificando o seu dinheiro, ao dizer que
ele está fazendo merda.
Aqui no Brasil, a educação
ganhou status de religião. A mãe que paga a escola não quer ver seu filho
criticado, afinal de contas, o boleto é caro. Do mesmo modo, o cliente
chato — e insistente — não quer ser repreendido; ganha-se o mantra do “o
cliente sempre tem razão”, em desfavor da alma do próprio empresário.
Vá à Itália e peça a comida
do jeito que você quiser e ouvirá, imediatamente, um sonoro: “Não. Vá comer em
outro canto”. Isso para o brasileiro é criminoso. Faz com que ele se insurja,
contando aos amigos: “Acredita que eu pedi para fazer o macarrão mais mole e me
disseram que não dava? Que ignorantes!”. Ele não enxerga que ele mesmo é que é
o pé no saco. Que não respeita nada nem ninguém. Vê no empreendedor alguém que
deve servi-lo, independentemente de quão imbecil e sem propósito sejam os seus
desejos.
O brasileiro de hoje está
acostumado ao mando, porque paga. O código de defesa do consumidor criou um
monstro, que custa a saúde emocional e física de milhões de empreendedores. O
meu maior conselho a vocês, é: construa uma empresa que você possa mandar o
cliente indesejado tomar no cu. Faça isso ou adoeça.
Entretanto, no mundo de
arco-íris e pôneis da geração Y, que é feita de vidro, isso é ser rude,
preconceituoso, antiquado, grosseirão. Às custas da própria saúde e do caixa da
empresa, ele manterá aquele cliente chato, pentelho, arrogante e que — muitas
vezes — nem te paga. É isso ou você não estará seguindo “o manual da
cordialidade do Facebook”.
A
conclusão? Não sei.
Da geração que iria mudar a
maneira com que o mundo se relaciona a um bando de bebês de meia idade, que
mora de aluguel e que o ponto alto do ano é o lançamento de mais um filme da
guerra nas estrelas.
Gente que ama a liberdade,
mas que está presa a um computador. Do tipo que está na décima quarta START-UP,
sempre atrás daquele round de investimento que o tornará milionário. A menina
que tem vergonha de dizer que é vendedora e que se apresenta como “líder-team
da equipe de vendas” e do blogueiro que é articulista e CEO no perfil do
Facebook.
Aonde
é que fomos parar? O que é que aconteceu com a GERAÇÃO Y? Assim como o garoto
do começo do texto: desculpem o desabafo.