Fenomenologia (do grego
phainesthai - aquilo que se apresenta ou que se mostra - e logos - explicação,
estudo) afirma a importância dos fenômenos da consciência, os quais devem ser
estudados em si mesmos – tudo que podemos saber do mundo resume-se a esses
fenômenos, a esses objetos ideais que existem na mente, cada um designado por
uma palavra que representa a sua essência, sua "significação". Os
objetos da Fenomenologia são dados absolutos apreendidos em intuição pura, com
o propósito de descobrir estruturas essenciais dos atos (noesis) e as entidades
objetivas que correspondem a elas (noema).
Edmund Husserl (1859-1938) -
filósofo, matemático e lógico – é o fundador desse método de investigação
filosófica e quem estabeleceu os principais conceitos e métodos que seriam
amplamente usados pelos filósofos desta tradição. Ele, influenciado por Franz
Brentano- seu mestre - lutou contra o historicismo e o psicologismo. Idealizou
um recomeço para a filosofia como uma investigação subjetiva e rigorosa que se
iniciaria com os estudos dos fenômenos, como estes aparentam à mente, para
encontrar as verdades da razão. Suas investigações lógicas influenciaram até
mesmo os filósofos e matemáticos da mais forte corrente oposta, o empirismo
lógico. A Fenomenologia representou uma reação à eliminação da metafísica,
pretensão de grande parte dos filósofos e cientistas do século XIX.
Husserl foi professor em
Gotinga e Friburgo em Brisgóvia, e autor de “Ficar Sem Estudar" – 1906.
Contrariamente a todas as tendências no mundo intelectual de sua época, quis
que a filosofia tivesse as bases e condições de uma ciência rigorosa. Porém,
como dar rigor ao raciocínio filosófico em relação a objetos tão variáveis como
as coisas do mundo real?
O êxito do método científico
está no estabelecimento de uma "verdade provisória" útil, que será
verdade até que um fato novo mostre outra realidade. Para evitar que a verdade
filosófica também fosse provisória Husserl propõe que ela deveria referir-se às
coisas como se apresentam na experiência de consciência, estudadas em suas
essências, em seus verdadeiros significados, de um modo livre de teorias e
pressuposições, despidas dos acidentes próprios do mundo real, do mundo
empírico objeto da ciência. Buscando restaurar a "lógica pura" e dar
rigor à filosofia, argumenta a respeito do principio da contradição na Lógica.
No primeiro volume de
“Investigações lógicas” - 1900-01, sob o título Prolegomena, Husserl lança sua
crítica contra o Psicologismo. Segundo os psicologistas, o princípio de
contradição seria a impossibilidade de o sistema associativo estar a associar e
dissociar ao mesmo tempo. Significaria que o homem não pode pensar que A é
"A" e ao mesmo tempo pensar que A é "não A". Husserl
opõe-se a isto e diz que o sentido do princípio de contradição está em que, se
A é "A", não pode ser "não A". Segundo ele, o princípio da
contradição não se refere à possibilidade do pensar, mas à verdade daquilo que
é pensado. Insistiu em que o princípio da contradição, e assim os demais
princípios lógicos, têm validez objetiva, isto é, referem-se a alguma coisa
como verdadeira ou falsa, independentemente de como a mente pensa ou o
pensamento funciona.
Em seu artigo “Filosofia
como ciência rigorosa" -1910-11- Husserl ataca o naturalismo e o
historicismo. Objetou que o Historicismo implicava relativismo, e por esse
motivo era incapaz de alcançar o rigor requerido por uma ciência genuína.
A
redução Fenomenológica
Fenomenologia é o estudo da consciência e dos
objetos da consciência. A redução fenomenológica, "epoche", é o
processo pelo qual tudo que é informado pelos sentidos é mudado em uma
experiência de consciência, em um fenômeno que consiste em se estar consciente
de algo. Coisas, imagens, fantasias, atos, relações, pensamentos, eventos,
memórias, sentimentos, etc. constituem nossas experiências de consciência.
Husserl propôs que no estudo
das nossas vivências, dos nossos estados de consciência, dos objetos ideais,
desse fenômeno que é estar consciente de algo, não devemos nos preocupar se ele
corresponde ou não a objetos do mundo externo à nossa mente. O interesse para a
Fenomenologia não é o mundo que existe, mas sim o modo como o conhecimento do
mundo se realiza para cada pessoa. A redução fenomenológica requer a suspensão
das atitudes, crenças, teorias, e colocar em suspenso o conhecimento das coisas
do mundo exterior a fim de concentrar-se a pessoa exclusivamente na experiência
em foco, porque esta é a realidade para ela.
O Noesis é o ato de perceber
e o Noema é o objeto da percepção – esses são os dois pólos da experiência. A
coisa como fenômeno de consciência (noema) é a coisa que importa, e refere-se à
conclamação "às coisas em si mesmas" que fizera Husserl.
"Redução fenomenológica" significa, portanto, restringir o
conhecimento ao fenômeno da experiência de consciência, desconsiderar o mundo
real, colocá-lo "entre parênteses", o que no jargão fenomenológico
não quer dizer que o filósofo deva duvidar da existência do mundo como os
idealistas radicais duvidam, mas se preocupar com o conhecimento do mundo na
forma que se realiza e na visão do mundo que o indivíduo tem.
Consciência
e Intencionalidade
Vivência (Erlebnis) é todo o
ato psíquico; a Fenomenologia, ao envolver o estudo de todas as vivências, tem
que englobar o estudo dos objetos das vivências, porque as vivências são
intencionais e é nelas essencial a referência a um objeto. A consciência é
caracterizada pela intencionalidade, porque ela é sempre a consciência de
alguma coisa. Essa intencionalidade é a essência da consciência que é
representada pelo significado, o nome pelo qual a consciência se dirige a cada
objeto.
Em “A Psicologia de um ponto
de vista empírico"- 1874 - Franz Brentano afirma: "Podemos assim
definir os fenômenos psíquicos dizendo que eles são aqueles fenômenos os quais,
precisamente por serem intencionais, contêm neles próprios um objeto".
Isto equivale afirmar, como Husserl, que os objetos dos fenômenos psíquicos
independem da existência de sua réplica exata no mundo real porque contêm o
próprio objeto. A descrição de atos mentais, assim, envolve a descrição de seus
objetos, mas somente como fenômenos e sem assumir ou afirmar sua existência no
mundo empírico. O objeto não precisa de fato existir. Foi um uso novo do termo
"intencionalidade" que antes se aplicava apenas ao direcionamento da
vontade.
A
Redução Eidética
Reconhecido o objeto ideal,
o noema, o passo seguinte é sua “redução eidética”, redução à ideia. Consiste
na análise do noema para encontrar sua essência. Isto porque não podemos nos
livrar da subjetividade e ver as coisas em si mesmas, pois em toda experiência
de consciência estão envolvidos o que é informado pelos sentidos e o modo como
a mente enfoca aquilo que é informado. Portanto, dando-se conta dos objetos
ideais, uma realidade criada na consciência não é suficiente - ao contrário: os
vários atos da consciência precisam ser conhecidos nas suas essências, aquelas
essências que a experiência de consciência de um indivíduo deverá ter em comum
com experiências semelhantes nos outros.
A redução eidética é
necessária para que a filosofia preencha os requisitos de uma ciência
genuinamente rigorosa de claridade apodítica, a certeza absolutamente
transparente e sem ambigüidade - requisitos antes mencionados por Descartes. Os
objetos da ciência rigorosa têm que ser essências atemporais, cuja
atemporalidade é garantida por sua idealidade, fora do mundo cambiável e
transiente da ciência empírica.
Por exemplo, "um
triângulo". Posso observar um triângulo maior, outro menor, outro de lados
iguais, ou desiguais. Esses detalhes da observação - elementos empíricos - precisam
ser deixados de lado a fim de encontrar a essência da ideia de triângulo - do
objeto ideal que é o triângulo -, que é tratar-se de uma figura de três lados
no mesmo plano. Essa redução à essência, ao triângulo como um objeto ideal, é a
redução eidética.
A
Intuição do Invariante
Não importa para a
Fenomenologia como os sentidos são afetados pelo mundo real. Husserl distingue
entre percepção e intuição. Alguém pode perceber e estar consciente de algo,
porém sem intuir o seu significado. A intuição eidética é essencial para a
redução eidética. Ela é o dar-se conta da essência, do significado do que foi
percebido. O modo de apreender a essência, Wesensschau, é a intuição das
essências e das estruturas essenciais. De comum, o homem forma uma multiplicidade
de variações do que é dado. Porém, enquanto mantém a multiplicidade, o homem
pode focalizar sua atenção naquilo que permanece imutável na multiplicidade, a
essência - esse algo idêntico que continuamente se mantém durante o processo de
variação, e que Husserl chamou "o Invariante".
No exemplo do triângulo, o
"Invariante" do triângulo é aquilo que estará em todos os triângulos,
e não vai variar de um triângulo para outro. A figura que tiver unicamente três
lados em um mesmo plano, não será outra coisa, será um triângulo. Não podemos
acreditar cegamente naquilo que o mundo nos oferece. No mundo, as essências
estão acrescidas de acidentes enganosos. Por isso, é preciso fazer variar
imaginariamente os pontos de vista sobre a essência para fazer aparecer o invariante.
O que importa não é a coisa
existir ou não ou como ela existe no mundo, mas a maneira pela qual o
conhecimento do mundo acontece como intuição, o ato pelo qual a pessoa apreende
imediatamente o conhecimento de alguma coisa com que se depara – que também é
um ato primordialmente dado sobre o qual todo o resto é para ser fundado.
Husserl definiu a Fenomenologia em termos de um retorno à intuição, Anschauung,
e a percepção da essência. Além do mais, a ênfase de Husserl sobre a intuição
precisa ser entendida como uma refutação de qualquer abordagem meramente
especulativa da filosofia. Sua abordagem é “concreta”, trata do fenômeno dos
vários modos de consciência.
A Fenomenologia não
restringe seus dados à faixa das experiências sensíveis, pois admite dados não
sensíveis (categoriais) como as relações de valor, desde que se apresentem
intuitivamente.
Redução
Transcendental
Embora tenha trabalhado até
o final de sua vida na definição do que chamou Redução Transcendental, Husserl
não chegou a uma conclusão clara. Basicamente seria a redução fenomenológica
aplicada ao próprio sujeito, que então se vê não como um ser real, empírico,
mas como consciência pura, transcendental, geradora de todo significado.
Para o fenomenólogo, a
função das palavras não é nomear tudo que nós vemos ou ouvimos, mas salientar
os padrões recorrentes em nossa experiência. Identificam nossos dados dos
sentidos atuais como sendo do mesmo grupo que outros que já tenhamos registrado
antes. Uma palavra não descreve uma única experiência, mas um grupo ou um tipo
de experiências; a palavra "mesa" descreve todos os vários dados dos
sentidos que nós consultamos normalmente quanto às aparências ou às sensações
de "mesa". Assim, tudo que o homem pensa, quer, ama ou teme, é
intencional, isto é, refere-se a um desses universais (que são significados e,
como tal, são fenômenos da consciência). E por sua vez, o conjunto dos
fenômenos, o conjunto das significações, tem um significado maior, que abrange
todos os outros, é o que a palavra "Mundo" significa.
Fenomenologia
e Fenomenalismo
A fenomenologia não pode ser
confundida com o Fenomenalismo, pois este não leva em conta a complexidade da
estrutura intencional da consciência que o homem tem dos fenômenos. A
Fenomenologia examina a relação entre a consciência e o Ser. Para o
Fenomenalismo, tudo que existe são as sensações ou possibilidades permanentes
de sensações, que é aquilo a que chamam fenômeno. O fenomenólogo,
diferentemente do fenomenalista, precisa prestar atenção cuidadosa ao que
ocorre nos atos da consciência, que são o que ele chama fenômeno.
Outros
Pensadores
Max
Scheler - um dos grandes expoentes da fenomenologia
Max
Scheler
O mais original e dinâmico
dos primeiros associados de Husserl, no entanto, foi Max Scheler (1874-1928),
que havia integrado o grupo de Munique quem realizou seu principal trabalho
fenomenológico com respeito a problemas do valor e da obrigação. Ampliou a
idéia de intuição, colocando, ao lado de uma intuição intelectual, outra de
caráter emocional, fundamento da apreensão do valor.
Heidegger
Discípulo de Husserl,
Heidegger dedicou a ele sua obra fundamental " Ser e Tempo" -1927,
mas logo surgiram diferenças entre ele e o mestre. Discutir e absorver os
trabalhos de importantes filósofos na história da Metafísica era, para
Heidegger, uma tarefa indispensável, enquanto Husserl repetidamente enfatizou a
importância de um começo radicalmente novo para a filosofia, queria colocar
"entre parênteses" a história do pensamento filosófico - com poucas
exceções como Descartes, Locke, Hume e Kant.
Heidegger tomou seu caminho
próprio, preocupado que a fenomenologia se dedicasse ao que está escondido na
experiência do dia a dia. Ele tentou em “ Ser e tempo” descrever o que chamou
de estrutura do cotidiano, ou "o estar no mundo", com tudo que isto
implica quanto a projetos pessoais, relacionamento e papeis sociais, pois que
tudo isto também são objetos ideais. Em sua crítica a Husserl, Heidegger
salientou que ser lançado no mundo entre coisas e na contingência de realizar
projetos é um tipo de intencionalidade muito mais fundamental que a
intencionalidade de meramente contemplar ou pensar objetos. E é aquela
intencionalidade mais fundamental a causa e a razão desta última.
Merleau-Ponty
Maurice Merleau-Ponty (1908-1961),
outro importante representante do Existencialismo na França, foi ao mesmo tempo
o mais importante fenomenólogo francês. Suas obras, “A Estrutura do
comportamento” (1942) e “Fenomenologia da percepção” (1945), foram os mais
originais desenvolvimentos e aplicações posteriores da Fenomenologia produzidos
na França.
Em sua tentativa de aplicar
a Fenomenologia ao exame da existência humana, como fez Heidegger, Sartre e
outros autores franceses desenvolveram uma linguagem sofisticada, recheada de
termos que caíram no gosto dos acadêmicos, mas se tornaram um obstáculo ao
entendimento da doutrina inclusive entre os próprios intelectuais.
Sartre
Jean-Paul Sartre (1905-1980)
Segue estritamente o
pensamento de Husserl na análise da consciência em seus primeiros trabalhos, “A
Imaginação” (1936) e “O Imaginário: Psicologia fenomenológica da imaginação”
(1940), nos quais faz a distinção entre a consciência perceptual e a
consciência imaginativa aplicando o conceito de intencionalidade de Husserl.
No seu “A Filosofia do
Existencialismo”, de 1965, Sartre declara que "a subjetividade deve ser o
ponto de partida" do pensamento existencialista, o que mostra que o
existencialista é primeiramente um fenomenólogo. A negação de valores e o
convite ao anarquismo implícitos na doutrina atraíram os pensadores de Esquerda
e afastaram os conservadores de Direita.
A
Fenomenologia e Outras Filosofias
O
Empirismo
Galileu (1564-1642), é
apontado como um dos fundadores do Empirismo pelo fato de aplicar aos objetos
de estudo a experimentação, algo que possui seu limiar na atitude de Galileu em
apontar sua luneta para o espaço, descobrindo posteriormente a não-existência
das esferas celestes, tal qual determinavam as premissas de Aristóteles. Desta
forma, Galileu lançou sua teoria com carência de provas (embora sua teoria
fosse consistente e embasada no seu experimento) passando posteriormente por
sessões da Inquisição Católica a fim de dirimir as dúvidas em relação ao
sistema Aristotélico. A nova atitude naturalista de Galileu de dúvida e
observação, inspirou Francis Bacon (1561-1626) a criar tábuas para o controle
da experimentação e o estabelecimento de leis científicas, o que levou
rapidamente o homem a novos conhecimentos no campo da astronomia, da química e
da física. A mesma atitude de observação e interpretação natural levada ao
estudo da mente e do conhecimento, deu origem à Corrente Empirista, que haveria
de afetar profundamente a filosofia e criar o Positivismo, ou seja, o
tratamento científico de todos os fatos e fenômenos, inclusive em Política.
John
Locke
O filósofo empirista
procurou no seu Essay Concerning Human Understanding (1690) demonstrar que
todas as idéias são registros de impressões sensíveis (ou são derivadas de
combinações, de associações entre essas idéias de origem sensível), e criticou
o pensamento de Descartes (1596-1650) de que existiriam algumas idéias que
seriam inatas - que o homem teria no espírito ao nascer -, como, por exemplo, a
idéia de perfeição. Segundo John Locke, alguma coisa é enviada pelos objetos e
é captada por nossos sentidos e dão causa à formação das idéias. Este
pensamento é a base da teoria corpuscular da luz.
David
Hume
Ainda mais contundente que
seu predecessor, Locke, Hume negou o valor do raciocínio dedutivo e denunciou
que a relação de causa e efeito não é suficiente como conhecimento, pois nada
encontramos entre causa e efeito senão que um acidente costumeiramente se segue
a outro. Estamos habituados a chamar o primeiro acidente de causa apenas porque
ele sempre acontece antes do segundo que chamamos de efeito. Ou seja, um efeito
não remonta necessariamente a sempre uma mesma causa. "O Sol nasce todos
os dias", logo "O Sol nascerá amanhã". Segundo Hume, nada nos
garante que NECESSARIAMENTE o sol nascerá amanhã. Entretanto, através do
hábito, tomamos uma crença (belief) de que isso acontecerá.
Psicologismo
e Historicismo
À influência da psicologia
associativa de Locke sobre a filosofia (ou teoria) do conhecimento se chamou
Psicologismo. É a teoria de que os problemas da epistemologia (a validade do
conhecimento humano) e inclusive a questão da consciência, podem ser
solucionados por meio do estudo científico dos processos psicológicos. A
Psicologia deve ser tomada como base para a Lógica. Os psicologistas entendiam
a lógica - domínio da filosofia - como ciência. Seria apenas uma disciplina
definidora, normativa, dos atos psíquicos, dos modos associativos do
pensamento, e suas matérias apenas regras para pensar bem, e não fonte de
verdade. A filosofia ficou fora de moda, "reduzida" a uma psicologia
científica vinculada ao Positivismo.
O historicismo representava
a mesma tendência empirista para uma interpretação científica da História. Os
fatos históricos somente poderiam ser compreendidos e julgados se confrontados
com a cultura estética, religiosa, intelectual e moral do período histórico em
que aconteciam, e não em relação a valores morais permanentes.
Idealismo
A Fenomenologia de Husserl é
uma forma de idealismo, porque lida com objetos ideais, com as ideias das
coisas em sua essência, tal como os idealistas Platão, Hegel e outros. Desde os
ensinamentos de Platão a filosofia nos diz que, por influência dos sentidos (a
construção das idéias que o homem tem em sua mente se faz por informação dos
sentidos, como dito por Locke) existem várias imagens possíveis de um objeto,
porém todas elas significando a mesma coisa, ou seja, todas elas redutíveis ao
mesmo significado, todas referindo-se ao mesmo objeto ideal, contendo a mesma
idéia, constituídas da mesma essência. Todas as imagens de mesa (o exemplo mais
freqüente nos textos) têm uns certos componentes que fazem com que cada uma das
imagens signifique "mesa", uma mesa maior, menor, alta ou baixa,
vista de cima ou de baixo, por uma pessoa míope ou por outra daltônica, não importa,
terá sempre aqueles componentes básicos que garantirão a aquele objeto o
significado de mesa.
Platão
Para Platão (428-347 AC),
essa essência de cada coisa, o que se chamou "universais", estava no
Mundo das Idéias que as almas humanas podiam vislumbrar antes da encarnação.
Aristóteles (384-322 AC) reconheceu de pronto a importância desse pensamento,
porém trouxe a essência das coisas para o mundo real, para as coisas mesmas. Em
uma mesa, por exemplo, havia algo que era sua essência, e que, não importando
quantas e quais fossem as variações acidentais, fazia que fosse uma mesa e não
outra coisa qualquer. Husserl, por sua vez, retira do objeto a sua essência e a
coloca na mente do homem. O objeto ideal mesa, o fenômeno da representação da
mesa na mente, independe de que haja qualquer mesa no mundo externo, no mundo
real, porque a essência de "mesa" está na própria mente.
Immanuel
Kant
A afinidade entre Husserl e
Kant está em ambos buscarem a condição de verdade do conhecimento. Husserl
sustenta que a verdade está no conhecimento das essências, e Kant, que ela
existe limitada às categorias do que é possível conhecer.
Segundo a filosofia do
conhecimento (Crítica) de Immanuel Kant (1724-1804), nós não podemos conhecer
as coisas inteiramente, porque nem todos os sinais que recebemos das coisas são
aceitos pela mente, e disto resulta que não podemos conhecer inteiramente o
real. Conhecemos do real apenas aquilo que a mente pode assimilar, e que ele
chamou fenômeno; ao que permanece incognoscível para nós ele chamou o noumeno.
Então Kant tomou a série de conceitos que Aristóteles havia listado como o que
podemos dizer das coisas, e transformou-a em uma série de categorias que são o
que podemos conhecer das coisas. Para Kant o dado empírico tem validade, porém nunca
validade absoluta ou apodítica. Husserl igualmente duvida do conhecimento
científico dos fatos e, para ele, o que deve ser procurado é o conhecimento
científico das essências.
Fenomenologia
e Psicologia
Carl
Stumpf
Foi de grande importância e
de grande impacto o pensamento fenomenológico na psicologia, na qual Franz
Brentano e o alemão Carl Stumpf haviam preparado o terreno, e na qual o
psicólogo americano William James, a escola de Würzburg, e os psicólogos da
Gestalt haviam trabalhado ao longo de linhas paralelas. Este método, e as
adaptações desse método, tem sido usados para estudar diferentes emoções,
patologias, coisas tais quais separação, solidão, solidariedade, as
experiências artística e religiosa, o silêncio e a fala, percepção e o comportamento,
e assim por diante.
Karl
Jaspers
Mas a Fenomenologia deu
provavelmente sua maior contribuição no campo da psiquiatria, no qual o alemão
Karl Jaspers (1883-1969), um destacado existencialista contemporâneo, ressaltou
a importância da investigação fenomenológica da experiência subjetiva de um
paciente.
O paciente psicológico é
paciente em vista do objeto ideal que em sua mente corresponde à realidade, não
importa qual a situação externa, e porque essa construção ideal difere do
padrão comum dos objetos ideais na mente das demais pessoas com respeito aos
mesmos estímulos dos sentidos. O psicólogo precisa encontrar o significado nos
objetos do mundo ideal do seu paciente, a fim de poder lidar com sua situação
psicológica.
Jaspers foi seguido pelo
suíço Ludwig Binswanger (1881-1966) e vários outros, inclusive Ronald David
Laing (1927-1989) na Inglaterra, na psiquiatria existencial da linha filosófica
ateia de Sartre; Viktor Frankl (1905-1997), com sua teoria da logotherapia, na
Áustria e, pioneiramente, Halley Bessa (1915-1994), no Brasil, ambos da linha
do existencialismo cristão de Gabriel Marcel (1889-1973).
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