Os desenhos são mais antigos que
a escrita, e por isso a cartografia precedeu o registro da História. Nossos
ancestrais souberam traçar, embora rudimentarmente, muitas particularidades do
terreno, para reproduzir um caminho percorrido. Foram as primeiras
manifestações gráficas da preocupação do homem, visando à comunicação através
dos itinerários. Assim nasceram os primeiros mapas e essa é até hoje a
utilidade imediata da cartografia. Mais tarde, com a necessidade de precisar
distâncias, surgiu a primeira unidade de medida: os dias de marcha, que
aparecem nos mapas babilônicos gravados em argila (3500 a 3000 a.C.). Outros
povos também foram precursores da cartografia, como os egípcios, que na época
de Ramsés Ii (1333- 1300 a.C.) efetuavam medições sistemáticas de suas terras.
Mas, por todo esse tempo, o mapa manteve a condição restrita de representar
porções ilimitadas de terra.
Foram os gregos os primeiros a se
preocupar com a representação do conjunto terrestre. Anaximandro, por volta de
500 a.C., observou a obliqüidade da eclíptica em relação ao equador, e pôs em
dúvida a concepção da Terra plana, preparando o primeiro planisfério em que
supunha o planeta com o formato de um disco. Inaugurava-se a era dos discários.
Alguns anos mais tarde, Hecateo, grande viajante, em sua obra Periegesis,
reafirmou esse conceito, cosntruindo um disco ao redor do qual colocou as águas
do mar, circundando as duas partes essenciais do mundo: Europa e Ásia.
A concepção esférica
No inicio do século IV a.C., Pitágoras teria introduzido a concepção
da Terra esférica. A idéia surgiu de especulações filosóficas – “... a esfera é
a mais perfeita de todas as formas, portanto, a Terra, obra-prima dos deuses,
deve ser uma esfera...”. Observações astronômicas confirmaram a hipótese, e
Aristóteles, em 350 a.C., demonstrou a esfericidade do planeta. Depois disso,
pode-se medir a obliqüidade do seu eixo de rotação, estabelecendo os conceitos
de equador, pólos, trópicos e a divisão da superfície em zonas tórridas,
temperadas e frias.
Por volta de 200 a.C., coube a Eratóstenes calcular a circunferência
terrestre: 252 000 estadias, ou seja, mais ou menos 45 000 quilômetros, com um
erro de 14 por cento quanto à medida verdadeira. A partir daí foi simples
estabelecer o raio da esfera terrestre, elemento fundamental na determinação
das latitudes e longitudes. Estavam dados os primeiros passos para a definição
dos sistemas de projeção cartográficas, ou seja, a transformação da superfície
esférica numa representação plana. Hiparco, em meados do século II a.C.,
inventou o astrolábio, instrumento que servia para calcular a altura dos astros
(em relação ao horizonte) e realizou a primeira projeção cartográfica que se
conhece, apoiando-se na trigonometria esférica e propondo um sistema cônico de
projeção.
A herança de Ptolomeu
Os conhecimentos cartográficos do mundo antigo alcançaram seu ponto
culminante na obra de Ptolomeu. Nascido em Alexandria no século II, dedicou
dois volumes da sua Geografia ao estudo da construção de globos, projeções e
mapas. Considera-se, mesmo, ser este o primeiro atlas geral elaborado.
No decorrer da Idade Média, dominada por superstições, a cartografia
conhece uma fase de decadência. Na Europa, utiliza-se o mapa-múndi circular, o
Orbis Terrarum do romanos, porém tão deturpado que perdera toda a exatidão
geográfica. A Terra Santa ocupava geralmente o centro desses mapas, seguindo-se
assim fielmente os textos bíblicos. Substitui-se a aplicação dos conhecimentos
matemáticos pela interpretação artística altamente inventiva. Nesta fase,
apenas os árabes mantiveram uma atividade cartográfica significativa.
No fim da era medieval, uma descoberta ligada à arte da navegação
imprimiu novo alento à cartografia: a bússola, instrumento que indica o norte
magnético. Introduzida na Europa por viajantes vindos da China, começou a ser
usada pelos navegadores no século XIII.
Surgiram as cartas portulanas, de origem desconhecida, mas que indicam
a utilização de bússolas na sua confecção. Com efeito, a característica
principal desses mapas é a superposição de uma rede de linhas ligando pontos
conhecidos. Tais linhas nada mais representam senão as referencias que os
navegantes deveriam utilizar para orientar-se pela bússola. Foram as primeiras
cartas marítimas. No Renascimento outros
fatores vieram juntar-se ao emprego da bússola para retomar o
desenvolvimento a cartografia. A
redescoberta dos textos de Ptolomeu, que os humanistas italianos, por volta de
1400, traduziram para o latim; a invenção da imprensa, que tirou da cartografia
o caráter artesanal; a melhoria das técnicas de navegação, que permitiu ao
marinheiro assinalar graficamente sua posição de maneira mais correta.
Com isso, os descobrimentos foram documentados por intensa produção
cartográfica. A terra começava a ser representada e m sua forma e dimensão
verdadeiras. Contudo, os mapas eram um segredo de Estado e, praticamente, cada
nação européia desenvolveu sua própria escola cartográfica, com variações
quanto aos conceitos e às formas de representação.
A revolução científica
Somente a partir de 1700 é que a cartografia perdeu, afinal, o caráter
decorativo em beneficio da precisão cientifica. Nesta época inventam-se novos
instrumentos: no mar, os antigos astrolábios são substituídos pelos sextantes e
a determinação das latitudes e longitudes deixa de ser exclusiva da astronomia
superior; o cronômetro passa a ser utilizado no cálculo das longitudes; em
terra, aperfeiçoa-se o sistema de triangulação na medida dos ângulos, através
da introdução dos teodolitos ópticos. As possibilidades dos novos instrumentos
permitiram corrigir toda uma série de erros acumulados durante séculos,
considerados já como verdades geográficas. Essas descobertas constituíram uma
verdadeira revolução que definitivamente separou a cartografia de suas ligações
com Ptolomeu.
Mapas Históricos Brasileiros:
Grandes Personagens da Nossa História. Ed.Abril Cultural, 1973.