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Está é uma página suplementar do blogue Construindo História Hoje (http://www.construindohistoriahoje.blogspot.com.br), estando a mesma vincula de modo factual ao blogue original e tendo as mesmas prerrogativas. As postagens apresentadas aqui podem conter conteúdo que expanda o universo dos estudos históricos para outras áreas e podendo ir além com abordagens variadas tão quantas o conteúdo. Deste modo distingui-a do blogue original que possuí seu foco unicamente nos estudos históricos.

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sábado, 5 de março de 2016

Laurentino Gomes e sua trilogia sobre a história do Brasil



“Às vezes é necessário fazer o que esperam que faça, pois infelizmente não passa de um jogo, mas um jogo cruel!”

Paranaense de Maringá e seis vezes ganhador do Prêmio Jabuti de Literatura (Prêmios Jabuti de Livro Reportagem e Jabuti de Livro do Ano 2008; Melhor Ensaio de 2008 pela Academia Brasileira de Letras), Laurentino Gomes é autor dos livros "1808", sobre a fuga da família real portuguesa para o Rio de Janeiro; "1822", sobre a Independência do Brasil; "1889", sobre a Proclamação da República; e “O caminho do peregrino” (em coautoria com Osmar Ludovico). O livro "1808" também foi eleito o Melhor Ensaio de 2008 pela Academia Brasileira de Letras e publicado em inglês nos Estados Unidos. Ao todo, suas obras já venderam mais de 2 milhões de exemplares no Brasil, em Portugal e nos Estados Unidos. Graças à repercussão dos seus livros, o autor já foi eleito duas vezes pela revista Época como um dos cem brasileiros mais influentes do ano. Formado em Jornalismo pela Universidade Federal do Paraná, tem pós-graduação em Administração na Universidade de São Paulo. É membro titular da Academia Paranaense de Letras.

Os livros não apresentam fatos inéditos ou abrem novas frentes de pesquisa, mas descrevem os eventos históricos sem hermetismos, linguagem direta e bem-humora, para o grande público.

7 perguntas para Laurentino Gomes

Com o seu novo livro 1889, Laurentino Gomes conclui a trilogia composta pelos sucessos editoriais 1808 e 1822. Os dois títulos venderam, juntos, mais de 1,5 milhão de exemplares, e ganharam, cada um, um prêmio Jabuti – mas ele garante que esse é seu último livro com data na capa. Paranaense radicado em São Paulo, o jornalista e escritor diz que a mudança de regime não provocou tantas transformações como se pode imaginar: “O que surpreende na República é que ela tem uma prática monárquica”.

Como foi a Proclamação da República?

A divergência entre monarquistas e republicanos fez com que a narrativa dos acontecimentos fosse difícil, porque há versões muito contraditórias. Uma delas diz que o marechal Deodoro da Fonseca entrou no pátio do Ministério da Guerra e deu um viva ao imperador. Outra, diz que, em vez de anunciar a mudança de regime, teria dito que levaria uma nova lista de ministros para a aprovação do monarca. Isso significa que ele não estava proclamando a república. Há uma informação também de que um jovem advogado teria dado um viva à República e ouvido, em seguida, do marechal que não era hora ainda.

Então, quando a República foi proclamada?

Na madrugada do dia 16, depois que Deodoro soube que o novo chefe de gabinete nomeado pelo imperador seria o Silveira Martins é que ele concorda com o golpe. Ele estava sendo pressionado por Benjamin Constant e pelos civis. Mesmo assim, é uma República provisória e permanece assim por mais de cem anos. Só em 1993 houve o plebiscito (em que a população brasileira escolheu entre o regime republicano ou monarquista, e entre presidencialismo ou parlamentarismo) prometido por Benjamin Constant. Estava no decreto do governo provisório que o Brasil seria provisoriamente uma república, até que o povo se manifestasse.

O nascimento da República também teve histórias pitorescas...

Às vésperas da Proclamação da República, Deodoro estava muito doente. Ele sofria de dispneia, que provocava falta de ar e de tosse. Em 14 de novembro, Benjamin Constant chegou a dizer para outros republicanos: “O golpe está gorado, porque Deodoro pode não estar vivo até amanhã.” Na madrugada do dia 15, Deodoro, por um milagre, decide levantar da cama e ir ao encontro das tropas que desciam de São Cristóvão em direção ao Campo de Santana (hoje, praça da República). Foi de charrete e, no meio do caminho, oficiais lhe deram um cavalo bem manso, já que ele estava muito debilitado. Foi com esse cavalo que Deodoro entrou no Ministério da Guerra e depôs o Visconde de Ouro Preto (presidente do Conselho de Ministros). Dois ou três dias depois, o cavalo foi aposentado por serviços relevantes prestados à República e passou o resto dos seus dias confortavelmente instalado no estábulo do Segundo Regimento de Cavalaria, sem trabalhar. Em 1891, Deodoro, estava submetido a uma pressão enorme, que levaria à sua renúncia, e quando viu o esboço do famoso quadro de Henrique Bernardelli em que está proclamando a República disse: “Vejam senhores, quem se deu bem nessa história toda foi o cavalo”.

A República traz muitas mudanças no campo político?

O que me surpreende nessa República é que ela tem uma prática monárquica. Ou seja, essa República – cujos propagandistas prometiam ampliar a participação, o voto popular, educar as pessoas, incorporar os excluídos, ampliar a cidadania – falha nessa tarefa. Ela logo se converte em uma ditadura, com Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. Quando o governo vai para as mãos dos civis, com Prudente de Morais e Campos Sales, a equação de poder é a mesma do Império. O presidente da República tinha um poder mais nominal que efetivo, e delegava o comando, de fato, à aristocracia rural. Além disso, o índice de participação eleitoral da República era inferior ao dos últimos anos do Império.

Essa equação de poder mudou?

Termino o livro num tom mais otimista, quando me refiro à campanha das Diretas, com o povo de fato pedindo eleições. E não é à toa que desde então nós temos pela primeira vez na nossa história trinta anos de democracia sem ruptura. Eu diria que a República só foi proclamada no Brasil em 1984.

Você acha que a linguagem acessível é a receita do seu sucesso?

Acho que sim. Às vezes as pessoas me perguntam se deixei de ser jornalista. Respondo que não, simplesmente mudei de formato. Antes fazia jornal e revista, agora faço livro. Mas o que eu faço é reportagem. Não é nem um almanaque de curiosidades, porque aí o livro seria irrelevante, nem um livro acadêmico, denso, com um mergulho muito profundo. É uma análise com elementos pitorescos, coisas bem-humoradas, perfis de gente de carne e osso, o que torna a história fascinante. Essa fórmula, se aplicada aos 500 anos de história do Brasil, tem muito tema pela frente.

O caso USP
Durante a minha participação no programa “Roda Viva” da TV Cultura, na última segunda-feira, por mais de uma vez os entrevistadores insistiram em uma pergunta que me persegue desde o lançamento do meu primeiro livro, “1808”. Queriam saber como tem sido a reação dos historiadores acadêmicos ao meu trabalho. “Você tem sentido algum ciúme por parte deles?”, inquiriu um dos jornalistas na parte final do programa.

Como sempre, tentei ser diplomático e afirmei que, ao contrário, a reação dos historiadores às minhas obras tem sido bastante generosa, em especial entre os professores que enfrentam diariamente na sala de aula o difícil desafio de atrair o interesse de crianças e adolescentes para o estudo da História do Brasil .

Um fato novo ocorrido esta semana me levou a crer que, infelizmente, as relações não são tão suaves como eu imaginava que fossem. Acabo de saber pelo jornal “Gazeta do Ipiranga” que a direção do Museu Paulista, instituição da Universidade de São Paulo (USP), vetou o lançamento do meu novo livro, “1889”, nas dependências do Museu Republicano de Itu, a cidade onde moro. O Museu Paulista é responsável tanto pelo museu ituano quanto pelo Museu do Ipiranga, em São Paulo.

Segundo a notícia publicada pela “Gazeta do Ipiranga”, a decisão do Museu Paulista foi uma represália a mim em virtude de uma reportagem de capa que, no final de agosto, assinei para a revista “Veja São Paulo”. No artigo, escrito a convite da direção da revista, eu criticava o estado de abandono em que se encontra o Museu do Ipiranga, fechado de forma atabalhoada e, no meu entender, desrepeitosa com o público às véspera do último feriado de Sete de Setembro. Incomodada com as minhas críticas, a direção do Museu Paulista recusou um pedido da Academia Ituana de Letras (ACADIL) e da Secretaria de Cultura de Itu para uma sessão de autógrafos do livro “1889” no Museu Republicano.

A Universidade de São Paulo é uma instituição que já pagou um alto preço na defesa do seu direito de liberdade de expressão e pensamento. Durante o regime militar de 64, vários de seus professores e funcionários foram aposentados de forma compulsória ou tiveram de fugir do país porque se opunham às autoridades constituídas e, por essa razão, corriam o risco de serem presos ou mesmo torturados nos porões do regime. A defesa intransigente desses direitos, mesmo à custa de tanto sacrifício, é uma das razões pela quais a USP se tornou uma instituição hoje admirada e respeitada por todos os brasileiros.

Diante das novas revelações, no entanto, só me resta lamentar essa mesma Universidade de São Paulo, tão perseguida durante a ditadura, agora se envolva num episódio de óbvia retaliação e censura a um jornalista que teve a ousadia de criticar seus professores-doutores responsáveis pelo Museu Paulista.

O prédio do atual Museu Republicano de Itu foi cenário importante dos acontecimentos que levaram à queda da monarquia brasileira em 1889, tema do meu novo livro. Nesse edificio se realizou em 1873 a famosa Convenção de Itu, na qual um grupo de fazendeiros e intelectuais da região decidiu a criação do Partido Republicano Paulista, cuja atuação seria fundamental na campanha republicana nos anos seguintes. Desse grupo sairam os dois primeiros presidentes civis do novo regime, Prudente de Morais e Campos Salles. Por essa razão, dediquei um capítulo do livro “1889” à Convenção de Itu. E, pelo mesmo motivo, eu me sentiria honrado em lançar a obra nas dependências do Museu Republicano.

Resta-me, porém, um consolo: a Universidade de São Paulo e o Museu Paulista, apesar de toda a sua importância do cenário educacional brasileiro, ainda não atingiram o poder institucional que a Igreja Católica deteve no final do Idade Média. Caso contrário, a esta altura muito provavelmente os meus livros já estariam sendo queimados em praça pública. E o autor também!

Sobre as obras

O que eu faço não é um trabalho convencional de pesquisa acadêmica na área de história. Isso já tem quem faça, e faça bem. Eu leio muito sobre o assunto, pesquiso documentos, mas principalmente vou aos locais onde as coisas aconteceram há 200, 180 anos, porque esses locais guardam ainda informações muito preciosas para um jornalista que tem um olhar atento. Por exemplo, no primeiro capítulo do livro eu falo do Riacho do Ipiranga e de quanto ele é poluído hoje. É um rio enquadrado, concretado, asfaltado pela metrópole. É um jeito de olhar para o passado com luzes do presente, o que ajuda o entendimento do leitor.

Geralmente a linguagem acadêmica é mais técnica. Não sou contra isso, não: é uma linguagem que a academia usa para se entender. São especialistas falando com especialistas. Já o jornalista se vale de uma linguagem mais acessível, mais didática, porque ele está se comunicando com um público muito mais amplo do que o público acadêmico. Isso gera alguns mal-entendidos. Tem gente que diz que jornalistas não deveriam escrever sobre história e reclama que os livros de história não vendem. Às vezes não vendem porque a linguagem não é adequada. Você não pode pegar uma tese de doutorado, publicá-la em forma de livro e esperar que seja um best-seller.


►Referências:









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