quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Antropogênese Suméria: a origem dos humanos.


A história mesopotâmica da criação é hoje melhor conhecida graças a várias edições babilónicas de Enuma Elish, o Poema da Criação, guardado nos arquivos dos templos. Estas versões são baseadas em traduções, ampliações e adaptações de textos ainda mais antigos da Suméria, Acádia e Assíria. Não há dúvida de que os elementos básicos fizeram parte da tradição cultural e oral em toda a região muito antes de terem sido escritos. Segundo estes contos antigos, o mundo inicial tinha uma natureza sombria e selvagem. Gerações de deuses e de demônios misturaram-se numa escuridão em remoinho, deixando em cada um sangue derramado e carne despedaçada, deuses filhos devorando seus pais para obterem os seus poderes divinos.

Os mitos fornecem vários cenários explicativos da separação da terra, da atmosfera e do céu, assim como para a criação do homem. As divindades supremas da Suméria eram o deus do céu, An, que governava atmosfera; Enlil, responsável pelo ar e pela terra, e a deusa Ninhursag. O quarto deus Enki, que governava entre a água e a terra, tinha diferentes papéis em diferentes mitos. Os Babilônios alteraram-lhes os nomes, mas não os papéis. An, por exemplo, passou a ser Anu, Enil tornou-se Ellil e Enki passou a ser Ea.

No Enuma Elish, os velhos deuses travavam grandes batalhas contra os deuses jovens.

A deusa demoníaca Tiamat, a divindade feminina do caos e consorte de Apsu, comandou os exércitos montada no seu cavalo. O campeão dos deuses jovens era Marduk, um guerreiro divino com quatro olhos, quatro orelhas e que deitava fogo pela boca. Montava um dragão com chifres e as suas armas eram os ventos e o raio.

Na terrível batalha que se seguiu, Marduk apanhou Tiamat numa armadilha de rede. De cada vez que ela gritava de raiva, ele forçava um dos sete ventos a entrar-lhe pela garganta abaixo até ela ficar inchada e indefesa.

Marduk despedaçou Tiamat e fez o céu, as estrelas e os planetas com a parte de cima do corpo dela, tendo aproveitado a parte de baixo para fazer a terra. Os seus muitos seios foram amontoados para formar montanhas. Os rios Tigre e Eufrates correram-lhe dos olhos.

Marduk organizou depois a paisagem obtida com esta criação, e, claro, deu-lhe um sol, Shamash.

Como recompensa por estes trabalhos, Marduk passou a ser o chefe dos deuses.

Os deuses jovens festejaram a derrota de Tiamat e o plano que traçaram do céu e da terra. Porém, o júbilo esfumou-se quando descobriram que as várias divindades que deveriam desenvolver um trabalho árduo, não gostavam de trabalhar. Os deuses da terra e do ar aborreciam-se com o imenso trabalho que era escavar os canais de irrigação, semear e colher os cereais para alimentar os outros deuses. Queixavam-se amargamente acerca destes fardos ao deus supremo, Anu (An) e ao vasto panteão de deuses. A hierarquia de trabalhadores divinos necessitava de uma base mais ampla.

Ea (Enki), deus das palavras mágicas, auxiliado pela deusa-mãe, fizeram pequenas figuras de barro que deveriam fazer os trabalhos por eles. Como punição pelo papel na grande guerra entre os deuses, o general de Tiamat, Kingu, tinha de ser sacrificado para fornecer a força vital à raça de escravos que iria servir os deuses.

Assim, Marduk matou-o e o sangue de Kingu foi usado para animar as figuras de barro.

Não era suficiente que estes escravos humanos fizessem o trabalho dos deuses, tinham também de satisfazer as suas extravagâncias e caprichos. Nas histórias mais antigas, do tempo dos Sumérios, os deuses praticavam jogos cruéis e descuidados com as figuras de barro, criando-os apenas para diversão dos seus senhores preguiçosos e beberrões. Algumas figuras de barro eram deliberadamente deformadas para que os deuses pudessem apostar no comportamento e na vida das criaturas que delas resultavam. Numa outra história antiga, um pastor e um trabalhador rural eram lançados numa competição sem descanso para os deuses poderem apostar qual deles tinha mais valor.

Mesmo assim, os humanos continuavam a ser objetos mortais de diversão dos deuses imortais, cujo préstimo parecia unicamente ser a capacidade de trabalho que tinham - ferramentas descartáveis quando já não prestavam.
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